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8 de Maio de 2024
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    Concursos públicos para cadastro de reserva - Geraldo Nogueira

    Publicado por OAB - Rio de Janeiro
    há 11 anos

    A banalização dos concursos públicos para cadastro de reserva tem se tornado uma prática corriqueira aplicada pela administração pública. É através dessa prática que o edital divulga o certame sem definir o número de vagas oferecidas, estabelecendo apenas que os candidatos aprovados poderão ser nomeados durante o prazo de validade do concurso.

    Esse é um recurso que colide com o princípio do livre acesso aos cargos e empregos públicos, consagrado no inciso I, do art. 37, da Constituição Federal, mesmo assim tem encontrado espaço no setor público, trazendo prejuízo aos inscritos que nem mesmo sabem o número de vagas que será disputado. Essa forma de concurso pode prejudicar ainda mais a pessoa com deficiência, pois como não se sabe previamente o número de vagas por cargo, o gestor poderá agir com preconceito evitando a abertura de vaga para o cargo no qual tenha sido aprovada uma pessoa com deficiência.

    O concurso sem a quantificação das vagas existentes, somado aos diferentes critérios de nomeação tem ameaçado a reserva de vagas, colocando em xeque a legislação pertinente.

    A reserva de vagas em concurso público para candidatos com deficiência é um direito fundamental, previsto na Constituição Federal, art. 37, inciso VIII; vejamos:

    Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte: VIII - a lei reservará percentual dos cargos e empregos públicos para as pessoas portadoras de deficiência e definirá os critérios de sua admissão;

    Recentemente a Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, aprovada com força de emenda constitucional, em seu art. 27, alíneas a, b e g, impôs aos Estados signatários a obrigação de incluir as pessoas com deficiência no mercado de trabalho, o que abrange também o setor público. Estas determinações constitucionais estão reguladas pela Lei Federal n.º 7.853/89 e Decreto nº 3.298/99.

    Lei Federal n.º 7.853/89: "Art. - Ao Poder Público e seus órgãos cabe assegurar às pessoas portadoras de deficiência o pleno exercício de seus direitos básicos, inclusive dos direitos à educação, à saúde, ao trabalho, (...).

    Decreto Federal n.º 3.298/99:"Art. 37 - Fica assegurado à pessoa portadora de deficiência o direito de se inscrever em concurso público, em igualdade de condições com os demais candidatos, para provimento de cargo cujas atribuições sejam compatíveis com a deficiência de que é portador". § 1º. O candidato portador de deficiência, em razão da necessária igualdade de condições, concorrerá a todas as vagas, sendo reservado no mínimo o percentual de cinco por cento em face da classificação obtida.

    § 2º. Caso a aplicação do percentual de que trata o parágrafo anterior resulte em número fracionado, este deverá ser elevado até o primeiro número inteiro subseqüente.

    Para manter o princípio da igualdade de oportunidade entre os demais candidatos e a pessoa com deficiência, o Decreto citado determina: Art. 41. A pessoa portadora de deficiência, resguardadas as condições especiais previstas neste Decreto, participará de concurso em igualdade de condições com os demais candidatos no que concerne: I - ao conteúdo das provas; II - à avaliação e aos critérios de aprovação; III - ao horário e ao local de aplicação das provas; e IV - a nota mínima exigida para todos os demais candidatos.

    A dificuldade enfrentada pelos candidatos com deficiência surge quando a administração pública não obedece ao critério da alternância ou da chamada nomeação alternada. Imagine um concurso público feito apenas para classificação em cadastro de reserva, ainda que assegurado o percentual legal, a administração pública proceda por último à nomeação dos candidatos com deficiência. Este fato pode tornar impossível a nomeação destes candidatos, pois o concurso poderá vencer antes mesmo que o processo de nomeação alcance as vagas reservadas.

    O critério da alternância surge da necessidade de manter a eficácia do direito para a reserva de vagas e, dada a inexistência de regramento especifico, sua aplicação se ampara nos princípios da isonomia material e da proporcionalidade, construindo-se a partir da publicação do resultado do concurso em duas listas classificatórias (art. 42, do Dec. nº 3.298/99), onde uma é geral e outra especial. Na lista geral constarão por ordem de classificação, os nomes de todos os aprovados no concurso, incluindo as pessoas com deficiência. A lista especial conterá apenas os nomes das pessoas com deficiência, também por ordem de classificação. Desta forma, a pessoa com deficiência que estiver classificada, será nomeada para posse em vaga estabelecida no percentual delimitado pelo art. 37 do Decreto n.º 3.298/99, de forma alternada. Assim, nomeia-se primeiro um candidato da lista geral e, subseqüentemente, um da lista especial até o preenchimento das vagas reservadas.

    Caso o candidato com deficiência esteja bem classificado na lista geral, ele deverá ser nomeado obedecendo-se, primeiramente, a esta classificação, objetivando assim, a promoção da igualdade de condições com os demais. Entendemos que o candidato com deficiência que for nomeado dentro da classificação geral, não deva concorrer às vagas reservadas, destinando estas, tão somente aos candidatos que não alcançarem pontuação suficiente para classificação nas vagas gerais. A isso chamamos procedimento de nomeação alternada qualificada. Por essa razão é que o candidato com deficiência deve figurar nas duas listas, conforme inteligência do § 1º do art. 37, do Dec. nº 3.298/99.

    Por fim, devemos observar a inconstitucionalidade formal de lei municipal quando tratar da nomeação de candidatos com deficiência, pois conforme se depreende do art. 24, inciso XIV, da Constituição Federal, é de competência concorrente da União, dos Estados e do Distrito Federal legislar sobre normas de integração de pessoas com deficiência. Vejam que o mandamento constitucional não dá aos Municípios esta competência. Não obstante, em caráter suplementar, os Municípios podem legislar sobre essa matéria, desde que isso seja estritamente necessário ao interesse local, nos termos do inciso I, do art. 30 da CF. Como a inclusão de pessoas com deficiência, através de nomeação em concurso público não é matéria de interesse local, a lei municipal que dispuser sobre o assunto será formalmente inconstitucional, principalmente se restringir ou ampliar as determinações contidas no texto de norma de âmbito nacional ou estadual.

    O fato é que o preconceito e a discriminação encontram guarida na distorção das interpretações sobre o tema, de forma a burlar ou reduzir as chances de nomeação dos candidatos com deficiência, tornando muita das vezes, ineficaz a reserva legal. A nomeação alternada qualificada e o reconhecimento de que a pessoa com deficiência, que obtiver classificação suficiente para ocupar vaga não reservada, concorre estritamente a estas, reflete, no conjunto, critério que resguardará a efetividade da norma constitucional pertinente.

    Geraldo Nogueira é presidente da Comissão de Defesa dos Direitos da Pessoa com Deficiência.

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    Realmente é muito difícil a inclusão das pessoas com deficiência, pois existem inúmeras barreiras.Durante anos o setor público vem burlando a reserva de vaga para pessoa com deficiência nos concursos públicos. O § 2º do art. da Lei 8.112/1990 (limite de 20%) passou a ser o critério norteador no cálculo da reserva de vaga, prevalecendo sobre todas as normas de proteção a pessoa com deficiência (Decreto nº 3.298/1999, Decreto nº 9.508/2018, Decreto nº 6.949/2009 e Lei nº 13.146/2015). Dessa forma, a aplicação equivocada do limite de 20% resultou em um entendimento por parte do Poder Judiciário de que o surgimento da primeira vaga para PcD ocorre apenas na 5ª vaga de forma obedecer o limite de 20%. Com isso, difundiu o entendimento de que a reserva deve obedecer os limites da lei, sendo o mínimo de 5% (Decreto nº 3.298/1999) e o máximo de 20% (Lei 8.112/1990). Resumindo, primeiramente aplica-se o limite máximo de 20% e em seguida aplica-se o mínimo de 5%, essa é prática adotada atualmente e que resultou em dois critérios equivocados amplamente verificados nos concursos públicos, sendo eles: primeiro, o PcD ocupando a 5ª, 25ª,45ª, 65ª vagas e assim sucessivamente a cada 20, segundo, o PcD ocupando a 5ª, 21ª,41ª, 61ª vagas e assim sucessivamente a cada 20. O problema é que esse entendimento permitiu que os administradores públicos manipulassem o número de vagas até 04 de forma excluir as pessoas com deficiência, esta situação é claramente perceptível nos concursos públicos de cargos com pouca oferta de vaga (situação da maioria dos concursos públicos). Devido a isso, passou a surgir situações esdrúxulas em concursos públicos como por exemplo: oferta de 80 vagas divididas em 20 cargos, porém sem nenhuma vaga para pessoa com deficiência, ou seja, ofertaram 4 vagas para cada cargo, pois caso ofertasse a 5ª vaga, esta seria para o PcD. Além de ser evidente a discriminação no entendimento, este contém vários equívocos matemáticos e diversas incoerências, sendo elas: 1 – Enorme incoerência ao iniciar o cálculo pela aplicação do máximo sem antes ter sido materializado o mínimo de 5%; 2 – Não existe proporcionalidade nos dois critérios, visto que o resultado das razões não é uma constante (primeiro critério: 100/20 = 5, 100/5 =20, 100/5 = 20…, ou seja, 5 ≠ 20, segundo critério: 100/20 = 5, 100/6,25 = 16, 100/5 = 20…, ou seja, 5 ≠ 16 ≠ 20). Não existe constante de proporcionalidade, portanto, não há que se falar em proporcionalidade na reserva de vaga. Já o Decreto nº 9.508/2018, permite que o PcD ocupe a 2ª, 22ª,42ª, 62ª vagas e assim sucessivamente a cada 20. Percebe-se que na norma específica existe a constante de proporcionalidade (100/5 = 20, 100/5 = 20, 100/5 = 20, 100/5 = 20 ….). Contudo, a norma é inexequível diante da aplicação equivocada do limite de 20% da Lei 8.112/1990; 3 – É inadmissível a ideia que uma lei de 3 décadas atrás prevaleça sobre as normas específicas; 4 – Essa situação vem contribuindo para o agravamento do cenário da inclusão da Administração Pública, cenário este que é lastimável (será apresentando a seguir); 5 – Flagrante desrespeito ao art. 121º da Lei Brasileira da Inclusão, Lei nº 13.146/2015, pois adotam o 2º do art. da Lei 8.112/1990 em total prejuízo as pessoas com deficiência; 6 – Flagrante descumprimento da Convenção Internacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência (alínea g e h do art. 27 do Decreto n 6.949/2009); 7 – Percebe-se também que a Lei 8.112/1990 não tem coerência com o inciso VIII, art. 37º da CF, visto que não conseguiu sequer definir o percentual de reserva, pois deixou grande margem à discricionariedade (Ex: 0,1% a 20%). Além disso, não estabeleceu os critérios de admissão da pessoa com deficiência. O curto período de tempo destinado a seu debate também é outro indício para que seja afastada a correspondência à finalidade teleológica do comando constitucional. A própria ementa da Lei nº 8.112/1990 não contribui para uma suposta tentativa de regulamentar a reserva de vaga; 8 – Os equívocos matemáticos são graves, pois é claramente perceptível. Por exemplo, no critério “PcD ocupando a 5ª, 25ª,45ª, 65ª” percebe-se que a 2ª,3ª,4ª,21ª, 22ª,23ª,24ª, 41ª,42ª,43ª,44ª… fere um dos limites definido pelo entendimento equivocado, ou seja, o mínimo de 5%; 9 – Matematicamente é evidente que a inclusão no quadro da Administração Pública não alcançará sequer uma proximidade com o mínimo de 5%, visto que inicia-se a reserva de vaga aplicando a restrição de 20%. Isto será demonstrado no texto do Relatório de Inclusão acessado através do seguinte link: Os dados são do sistema RAIS Cotas PcD para o ano de 2016. O que chama bastante atenção é o cenário gravíssimo do setor público, pois este apresenta dados assustadores. Precisamos de justiça neste tema! continuar lendo