PF ficará fora de apuração sobre morte de coronel
Embora a Comissão Nacional da Verdade tenha pedido ao governo federal a participação da Polícia Federal nas investigações da morte do tenente-coronel reformado do Exército Paulo Malhães, de 77 anos, torturador confesso de presos políticos no período da ditadura militar, o delegado adjunto da Delegacia de Homicídios da Baixada Fluminense (DHBF), William Pena Júnior, informou ontem que, inicialmente, não pedirá ajuda à Polícia Federal.
Por meio da assessoria da Polícia Civil, Júnior explicou que tomou a decisão porque o caso está sendo tratado até o momento como latrocínio (roubo seguido de morte). Mas ele mesmo não descartou outras hipóteses para o crime, como queima de arquivo.
Na última sexta-feira, a Polícia Federal ofereceu ajuda ao governo do Rio, depois do pedido da Comissão da Verdade, e o ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, conversou com o diretor-geral da PF, Leandro Daiello, sobre a possibilidade. A ministra dos Direitos Humanos, Ideli Salvatti, também defendeu a participação da PF.
A partir de hoje, William Pena Júnior deverá ouvir os cinco filhos de Malhães, além de duas ex-mulheres do tenente-coronel reformado. A viúva de Malhães e o caseiro já foram ouvidos. Uma testemunha fez o retrato falado de um dos três criminosos que invadiram o sítio do militar na última quinta-feira, em Nova Iguaçu, na Baixada Fluminense. A polícia, no entanto, ainda não divulgou a imagem.
O corpo de Paulo Malhães estava no chão, de bruços, com o rosto num travesseiro. Os bandidos levaram R$ 700, dois computadores, armas e jóias. A mulher de Malhães e o caseiro da propriedade também foram mantidos reféns. O militar foi enterrado no sábado no cemitério municipal de Nova Iguaçu.
Ontem, o sítio de Paulo Malhães estava fechado. Um irmão da viúva do militar contou que o local está sendo preservado para as investigações da polícia, e para que parentes evitem contatos com a imprensa. Vizinhos da propriedade, localizada numa área rural de Nova Iguaçu, dominada pelo tráfico, disseram que Malhães era reservado e pouco saía de casa.
"No dia do crime, não vimos movimentação suspeita. Só fomos saber do passado dele depois que a imprensa informou", disse um morador, que pediu para não ser identificado.
Apesar da repercussão do caso, William Pena Júnior não esteve ontem na DHBF. No sábado, o delegado adjunto e outros policiais permaneceram no sítio por quase duas horas fazendo perícia complementar. A expectativa era que possíveis testemunhas e familiares fossem ouvidos ainda ontem. Por enquanto, não há data para a reconstituição do crime.
Como O Globo revelou anteontem, a guia de sepultamento do tenente-coronel reformado informava que a morte foi ocasionada por um edema pulmonar e uma isquemia no miocárdio.
Para o perito criminal e médico legista Nelson Massini, com base nessas informações, a morte de Malhães não teria ocorrido por algum tipo de violência, como asfixia (uma das hipóteses iniciais da polícia, já que o corpo não tinha marcas de tiro). De acordo com Massini, é provável que o tenente-coronel tenha sofrido um infarto devido à situação por que passou.
Ainda de acordo com o especialista, a causa da morte apontada na guia de sepultamento, na maioria dos casos, também está registrada na certidão de óbito, não divulgada pela família. Parentes de Paulo Malhães confirmaram que o militar tinha problemas cardíacos.
Em junho de 2012, pela primeira vez, Paulo Malhães revelou ao Globo detalhes de como era a rotina da Casa da Morte, residência situada em Petrópolis, na Região Serrana. O local funcionava como centro de torturas da repressão. Segundo Malhães, nada ali foi feito à revelia do Centro de Informações do Exército (CIE).
Em março deste ano, em nova revelação do tenente-coronel ao Globo, ele contou que foi responsável por dar um fim ao corpo do ex-deputado Rubens Paiva: foi encarregado de desenterrar o corpo de Paiva e jogá-lo ao mar.
Também este ano, em depoimento à Comissão da Verdade do Rio, há cerca de um mês, o militar contou que o destino das vítimas da Casa da Morte era um rio na Região Serrana, e que, para evitar a identificação dos corpos, as arcadas dentárias e os dedos das mãos eram antes arrancados.
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